quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Contagem regressiva

Daqui a vinte dias
ela vai aterrissar na sua primavera
sal sobre neve
derretendo as pedras
e esse seu coração cortado em pétalas

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

oferta

só posso me dar, só posso me oferecer
não tenho telas, não pinto quadros
nem portos, nem méxicos, autorretratos
mas estou inteira quando  vejo e fotografo
a exposição de Arthur Bispo do Rosário
veleiros carrosseis
colheres pentes finos canecas de alumínio
sou eu a própria cama de Romeu e Julieta
onde o amor, maior ainda que a arte,
(manto traiçoeiro de Penélope)
violentamente se faz e desfaz

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

achados e perdidos

no lixo orgânico casca de bananas
fiapos de cabelo
arquivo de três dias da semana
restos de culinária vegetariana
cascas de cenoura
soja hidratada com pingos de molho shoyu
exalando a cor gostosa do café

no lixo reciclável
notas do supermercado e boticário
carteiras de cigarro
mesmo que seja médico,
mesmo que seja mágico, ator
atleta, corretamente gay descomplicado

quem não se viu ao contrário?
confuso, alterado por dioniso,
atacando a mulher errada
desejo de sangue latino
dos secos e molhados
rompendo tratados
traindo ritos
sem se sentir preso nem vencido

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

as passageiras

enquanto uma trazia os livros de porto
a outra levava tortas para os filhos
chapeuzinho vermelho às avessas
trocando o bosque pelo avião

Indo para Juiz de Fora
depois do voo ainda tinha um ônibus
e os doces congelados para viagem
resistindo intrépidos na bagagem de mão

chocolates com palavras
risos de mães voadoras
bruxas com suas vassouras
a mais de mil pés do chão

poltronas L I F E
uma morena e uma loura
e um homem de negócios
desarvorado, aturdido
esquecendo o nome das coisas
engenheiro ex-pragmático e sisudo
começou a ficar muito risonho
prensado, apertado
no meio das duas doidas

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

partos de Zeus

  quero a calma desses livros aí na estante
      arrumados, comportados
fingindo que não estão na pândega

mas os cabelos soltos das bacantes
            pelo chão
   a poeirinha não varrida
falam com gosto das tuas filhas

harém de leão com seus filhotes
      com suas leoas ruivas
        lar da pá virada
onde o escritório em ordem disfarçada
      oculta a luxúria sem luxo
de quem respira ( anfíbio) por palavras

varando sem pudor as madrugadas
   com luzes tímidas, passos cuidadosos
      notívago, lobo e pai
        nas ruas de florença

todo poeta é um perigo de nascença

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

as saudades

você podia perder
as pessoas que conhecia
no ônibus, no voo, no trem

você  podia perder
os amigos que iam embora
as cidades que se afastavam
 ilhas  visitas hóspedes

inquietantemente próximos
presentes e claros demais
já não se perdem mais