terça-feira, 5 de agosto de 2014

Na lavanderia

Estou ouvindo a música da máquina de lavar
lavando os trapos, os farrapos, os sapos
todos que tenho que engolir do chefe do setor
que acha que só tem gente saudável e gostosa
nesse mundo

Estou ouvindo a música da máquina de lavar
a rádio fm feminina mulher furor
e uma adolescente entrevistada dizendo: eu sou nescau
recalque bate em mim e volta radical


vou passar roupa, cozinhar e voltar para casa
às quatro, de quatro, com o corpo todo doído
de estafa e ainda trabalhar para esse marido
chinês 
ex-presidiário, criminoso, safado
os quatro filhos e tudo
mas dizem que foi eu que escolhi,  colhi,
encolhi feito coelha
com essa colheita de filhos , esse tanto de trabalho
esse caralho, essa porra, essas crianças chorando

e por toda parte essa placa dizendo que é proibido fumar,
fumar, fumar, não posso fumar no trabalho, não posso fumar
em casa, não posso mais fumar em lugar nenhum
vou acender um cigarro no banheiro
tocar fogo no papel higiênico, na lixeira, incendiar tudo
também no aeroporto onde faço faxina terceirizada aos sábados

na rádio está tocando agora Belchior
não vou deixar meu cigarro se apagar pela tristeza
acho que foi por isso que ele fugiu para o Uruguai

Um comentário:

  1. Iracema, li teu Caderno, perdi o meu [já encontrei] e te escrevi

    AOS (M)TEUS VERSOS

    perdi
    meu caderno
    onde tinha anotado as últimas passagens
    desenhado paisagens
    personagens, um sonho

    e agora, Iracema?
    que não tem palavra que chegue
    que componha um poema sequer
    que não tem letra ao alcance
    que bote um verso de pé?

    só desejo que meus versos
    deixem o papel
    e tragam meu caderno
    com vida
    (como formigas carregam folhas)

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